E quem diria que o caipira um dia seria objeto de análise semiótica na linha peirceana. Foi partindo dessa ótica que a escritora Durce Gonçalves Sanches estudou a obra do artista plástico Almeida Júnior e lançou seu olhar nas imagens que retratam o modo de vida do interior paulista. O resultado pode ser conferido no livro O modo de vida do caipira em obras de Almeida Júnior, que será lançado na sexta-feira, dia 14, a partir das 19h30, no auditório do Sincomércio, em Itu. Durante a ocasião haverá show do violeiro e escritor Paulo Freire, que irá contar um bocado de causo e cantar outro tanto de moda.
Assumidamente de origem caipira, Durce - que nasceu em Coroados, cidade do interior do Estado de São Paulo -, afirma que é daí que vem o interesse pelas obras de Almeida Júnior. Sua pintura remete muito à minha própria origem, cultura. Eu nasci em fazenda e morei no campo, justifica.
Dividido em três capítulos, o livro começa com uma explicação do que vem a ser o caipira. Depois, aborda a vida acadêmica de Almeida Júnior e, por fim, a obra encerra-se com o capítulo referente à pesquisa sobre os aspectos da cultura caipira tecidos pelos pincéis do artista. Falo sobre o lazer, modo de vida, habitat, vestimenta e alimentação, enfim, um estudo completo sobre o caipira, numa análise semiótica na linha peirceana, esclarece Durce.
A escritora lembra que Almeida Júnior tem várias obras invocando o contexto caipira. Ele foi um grande pintor caipira paulista e eu busquei nesse olhar encontrar uma resposta a meu sentimento de pertencimento a essa cultura.
No último capítulo é que Durce analisa cinco obras do artista: Cozinha Caipira, Nhá Chica, Caipira Picando Fumo, Amolação Interrompida e O Violeiro. São pinturas bem características. Em ‘Cozinha Caipira falo sobre a moradia e observo o rústico no modo de alimentação. No caso de ‘Nhá Chica, que mostra uma mulher à janela pitando fumo, a obra revela um costume. ‘Caipira Picando Fumo é o momento de lazer e despreocupação com o mundo. A tela mostra um homem em seu meio rural, com o rosto marcado pelo sol. É possível observar nessa pintura a verdadeira face do homem do campo, a personalidade do caipira diante das diversidades que o meio produz revela a calma e a passividade, explica.
Já em Amolação Interrompida, Durce observa que o artista procurou revelar a virilidade e força típicos do exercício bruto do homem do campo. Nela ainda se encontra o processo de miscigenação, conforme fala Darcy Ribeiro. O lenço na cabeça é um recurso do homem do campo para amenizar o calor, enfim tudo tem um significado, acrescenta.
Finalmente, O Violeiro, é sobre um momento de conquista. A viola nos braços do homem traduz a sedução feminina, sendo embalada pelo universo masculino. A viola é o instrumento preferido na zona rural e remete muito à cultura caipira, esclarece.
Durce conta que selecionou especificamente essas obras por uma questão particular, de gosto mesmo. Sempre admirei essas obras e fiz menção a elas durante as aulas que ministro de formação continuada para professores da rede municipal. Nos meus cursos, levo a turma para o Espaço Almeida Júnior para que os professores saibam mais sobre nossas raízes.
No capítulo que aborda a formação acadêmica de Almeida Júnior, Durce avisa: Todo mundo espera que eu conte as fofocas da vida dele, mas não faço isso. Me atenho a seus estudos na pintura.
O livro que analisa as obras de Almeida Júnior é resultado de tese de mestrado em Comunicação e Cultura pela Universidade de Sorocaba (Uniso), sob orientação da professora Maria Ogécia Drigo. O público-alvo, conforme Durce, são os caipiras de Itu e da região. É um livro com linha acadêmica que pode ser lido por pessoas que se interessam em saber sobre nossas origens. Gostaria que meu livro fosse compreendido como parte de meu sentimento de pertencimento a uma cultura que não posso negar.
Durce Gonçalves Sanches é formada em Letras, Pedagogia, Direito e Saúde Pública, pós-graduada em Língua Portuguesa e em Comunicação e Cultura. É estudiosa dos dialetos, dedicando-se à pesquisa da variante caipira. Atualmente mora de Itu, onde é membro da Academia Ituana de Letras (Acadil), tendo como seu patrono o poeta Guilherme de Almeida.
Exposições destacam a obra do artista
Para quem for a Itu prestigiar o lançamento do livro, a dica é aproveitar para conferir as duas exposições sobre Almeida Júnior que estão em cartaz na cidade: Almeida Júnior: o Homem e a Natureza, no Regimento Deodoro (Quartel de Itu), e Retratos no Museu Republicano. Os eventos são em homenagem aos 160 anos de nascimento de Almeida Júnior (1850-1899), completados em 2010.
A exposição do Quartel é composta por obras valiosas do artista, cedidas pela Pinacoteca do Estado. São ao todo 20 pinturas que retratam a temática do homem do interior, seus hábitos e o ambiente em que vive. E como não poderia deixar de ser, Caipira Picando Fumo e O Violeiro estão entre elas. A curadoria é de Ana Paula Nascimento, do corpo técnico da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Por meio de uma cronologia ilustrada com reproduções de pinturas e de fotografias, o público poderá conhecer ainda um pouco da trajetória do pintor, que se destacou principalmente pela temática regionalista e por ter transposto à tela a luz brasileira. As visitas podem ser feitas até o dia 20 de junho no Auditório do 2´ Grupo de Artilharia de Campanha Leve - Regimento Deodoro (Praça Duque de Caxias, 284, Centro, Itu). De terça-feira a domingo, das 10h às 16h30. Para atender melhor o público, a exposição conta com serviço de visita monitorada. Entrada gratuita. Outras informações: (11) 4022-1184.
Já a mostra Retratos, no Museu Republicano, exibe oito trabalhos que mostram o lado de grande retratista de Almeida Júnior, que sob encomenda, pintou membros da elite paulista nas décadas finais do século 19, ligados à vida econômica e política da Província e depois Estado de São Paulo. As visitas podem ser feitas até o dia 31 de julho, 10h às 16h, de terça-feira a domingo. Endereço: rua Barão de Itaim, 67, Centro, Itu. Entrada gratuita. Outras informações: (11) 2065-8018.
SERVIÇO
O Sincomércio está localizado na rua Maestro José Vitório, 137, centro de Itu.
Evento aberto ao público em geral.
O livro, editado pela Ottoni, tem 165 páginas e pode ser adquirido no lançamento a R$ 30.
Nas livrarias o preço será R$ 40.
(Daniela Jacinto-Jornal Cruzeiro Do Sul)
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